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Discos para descobrir em casa – ‘O som do sim’, Herbert Vianna, 2000

♪ DISCOS PARA DESCOBRIR EM CASA – O som do sim, Herbert Vianna, 2000

♪ Projetado em escala nacional a partir de 1983 como vocalista e guitarrista do power trio carioca Paralamas do Sucesso, Herbert Vianna contribuiu decisivamente para a consolidação da banda por ser o principal compositor desse grupo que nasceu em 1981 entre as cidades de Rio de Janeiro (RJ) e Brasília (DF).

A trajetória profissional deste paraibano de João Pessoa (PB) – nascido em 4 de maio de 1961 – é indissociável da carreira do trio que, após início com ecos da banda inglesa The Police, imprimiu as próprias digitais em obra tão sólida quanto pioneira na derrubada dos muros altos que, nos anos 1980, separavam o rock da MPB.

Ao mesmo tempo, Herbert Lemos de Souza Vianna se descolou eventualmente dos Paralamas como compositor de canções de bom acabamento pop.

Sozinho ou com parceiros, o artista forneceu baladas sedutoras para os repertórios de cantoras como Marina Lima (Nada por mim, parceria com Paula Toller que se tornou hit do álbum Todas em 1985), Dulce Quental (Caleidoscópio, sucesso de 1987), Fernanda Abreu (Um amor, um lugar, canção de 1997) e Ivete Sangalo (Se eu não te amasse tanto assim e A lua Q eu T dei, baladas românticas feitas com Paulo Sérgio Valle e lançadas pela cantora baiana em 1999 e 2000).

Por conta dessa fina sintonia da obra do compositor com o canto feminino, soou natural a reunião de tantas cantoras – Cássia Eller (1962 – 2001), Daúde, Érika Martins, Fernanda Abreu, Fernanda Takai, Luciana Pestano, Nana Caymmi, Sandra de Sá e Zélia Duncan – no vasto time de convidados do terceiro álbum solo de Herbert Vianna, O som do sim, lançado em setembro de 2000 pela EMI, gravadora que editou todos os discos dos Paralamas do Sucesso e de Herbert até ser encampada pela Universal Music em 2013.

Mais pop do que os dois antecessores álbuns da espaçada discografia solo do artista, o experimental Ê batumaré (1992) e o acústico Santorini blues (1997), O som do sim se revelou álbum de espírito gregário e flagrou Herbert Vianna já maturado como compositor.

Nada menos do que cinco produtores musicais – Beto Villares, Carlo Bartolini, Chico Neves, Liminha e Tom Capone (1966 – 2004), este creditado sob o pseudônimo de Capitão Antônio – foram arregimentados para dar forma às 11 faixas deste disco de repertório (quase) inteiramente inédito e autoral.

Se o ouvinte começasse a audição de O som do sim pela utópica canção Vamos viver (1996), talvez supusesse equivocadamente que se tratava de álbum de baladas.

Sim e não. Entre baladas como Vamos viver, gravada por Herbert com Sandra de Sá, cantora que apresentara a canção há quatro anos no álbum A lua sabe quem eu sou (1996), o compositor disparou petardos como História de uma bala (2000), música – cantada pelo autor com Fernanda Abreu – sobre a morte que explode em becos escuros que abafam a violência da selva das cidades.

Essa violência também ergueu O muro (2000), faixa sombria que abriu o disco com a voz e o discurso do rapper Gustavo Black Alien.

Em clima bem mais ameno, a canção Partir, andar (2000) clareou a madrugada e, com arranjo luminoso do maestro Eumir Deodato, anunciou a alvorada em dueto de Herbert com Zélia Duncan que seria bisado no ano seguinte no próximo álbum da cantora Sortimento (2001).

E, quando o disco já estava claro, Nana Caymmi entrou em cena para dividir com o compositor a interpretação de canção ambientada no clima leve da bossa carioca, Hoje canções (2000), parceria de Herbert com Paulo Sérgio Valle cuja gravação tentou emular o tom da bossa nova com direito ao toque do piano de Marcos Valle.

Álbum que se alimentou dos contrastes entre tons claros e escuros, O som do sim ficou mais encorpado quando Cássia Eller trovejou com alma e voz de cantora de blues sobre o rock Mr. Scarecrow (2000), faixa gravada com a marcação da bateria de Bacalhau (então na banda Rumbora) e o toque do baixo de Marinho (do grupo de rap Pavilhão 9). Também houve eco do blues no toque da gaita e no canto de Luciana Pestano, convidada da música Eu não sei nada (2000).

A aspereza das guitarras de Herbert Vianna e de John Ulhoa contrastou com a maciez da voz de Fernanda Takai em A mais, música em que o compositor e o parceiro Pedro Luís expuseram o sonho de dias de paz na paisagem urbana em canção feita dias antes de a irmã de Pedro, Margot Mahrnada, ser assassinada no Rio de Janeiro naquele ano de 2000 – fato triste que fez com que a gravação de A mais fosse dedicada a Margot, poeta e também cantora carioca.

Faixa com a voz (e o sopro do trompete) de Moreno Veloso e o toque inventivo de músicos do vanguardista grupo carioca Mulheres que Dizem Sim (Domenico Lancellotti, Maurício Pacheco e Pedro Sá), Um truque transitou entre a bossa e a experimentação noise, mostrando a intenção de Herbert Vianna de invadir com o álbum O som do sim territórios musicais inexplorados pelos Paralamas do Sucesso.

Essa impressão foi reiterada pela moldura eletrônica de Une chanson triste (1997), música que encerrou o álbum com a adesão vocal de Daúde – cantora que apresentara a música no segundo álbum, #2 (1997), em dueto com o próprio Herbert – e com dedicatória a Renato Russo (1960 – 1996), colega e amigo de geração do dono do disco.

Única composição sem a assinatura de Herbert Vianna, In between days (Robert Smith, 1985) era sucesso do grupo inglês The Cure que ganhou abordagem feita pelo cantor brasileiro com Érika Martins.

Em essência, Herbert Vianna reafirmou habilidades em O som do sim, mas não teria tempo para exercitá-las no embalo da edição do disco.

Em fevereiro de 2001, o artista sofreu acidente de ultraleve que o deixou paraplégico, mas, ao contrário dos prognósticos mais pessimistas, Herbert Vianna voltou à cena como cantor, compositor e guitarrista, dando continuidade, em outro ritmo criativo, à trajetória dos Paralamas do Sucesso e apresentando, em 2012, um quarto álbum solo, Victoria, em que regravou as canções que dera para cantoras.

Contudo, decorridos 20 anos, o álbum O som do sim permaneceu como o título de melhor acabamento e de maior ousadia da discografia solo desse grande compositor da geração pop dos anos 1980.

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